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quinta-feira, 6 de agosto de 2009

O lixo no nosso quintal

Por: Cláudia Conceição Cunha

Recentemente fomos surpreendidos com a notícia de que funcionários do Ibama e da receita federal haviam interceptado uma carga de mais de mil toneladas de lixo doméstico que desembarcara nos Portos de Santos (São Paulo) e Rio Grande (Rio Grande do Sul). Os contêineres, contendo restos de alimentos, cabos de computador, papel, plástico e embalagens sujas de produtos de limpeza, seriam provenientes da Inglaterra. Um absurdo, claro! Quem, em sã consciência deixaria que o vizinho colocasse o lixo em seu quintal? Aliás, mesmo que o tal vizinho coloque seu lixo em seu próprio quintal, se o lixo for em grande quantidade, causar mal cheiro e oferecer o risco de atrair animais indesejáveis, provavelmente reclamaremos, não é mesmo?

E se o lixo vier para o nosso quintal de uma forma, digamos, enfeitada? Se ele vier elegantemente empacotado, com alguns remendos que o façam passar por algo útil, e que você só descubra que é verdadeiramente um lixo depois de começar a usar, e então perceber que, de quebra, obteve o acréscimo de mais lixo com os inúmeros papéis de presente que teve de desembrulhar?
Afinal, o que dizemos quando indústrias poluentes se instalam em nosso país, em nossa cidade e muitas vezes em nosso bairro? Com a desculpa (a bonita embalagem) de geração de empregos, empresas multinacionais são estimuladas a transferirem sua linha de produção para países ditos subdesenvolvidos onde a mão de obra barata, baixo custo de matéria prima e a ineficiente aplicação das leis ambientais formam a equação necessária para um aumento no lucro acompanhado por uma exportação do lixo gerado no processo de produção. E, nesse caso, eu me refiro a “lixo” no sentido mais amplo possível, pois o resultado desse processo deixa não apenas a sua parte visível na forma de poluição das águas, solo e ar, mas deixa ainda um resíduo social formado pela contaminação dos funcionários e pessoas que moram perto desses locais, além de, na maioria das vezes, estarem envolvidos com um tratamento desrespeitoso ao trabalhador.
De uma forma ainda mais camuflada, levamos para casa, diariamente, lixo desnecessário na forma de embalagens, de equipamentos que irão se deteriorar ou “sair de moda” rapidamente. Vejamos: qual a diferença entre receber sucata e comprar um equipamento que dentro de dois anos será trocado por outro? Quantos de nós já não falou em uma roda de conversa: “antigamente a geladeira durava mais...Antes um televisor levava tantos anos sem dar defeito...Pôxa, assim que acabou o prazo de garantia a máquina de lavar pifou...Meu computador está desatualizado, preciso de um novo...”?

A obsolescência programada (produção de bens de consumo com vida útil menor do que a possível) tomou novos contornos que ajudam a alimentar o mercado, gerando mais e mais resíduos. Vamos exemplificar com um dos mais novos e difundidos fetiches da humanidade: o celular! Antes um “tijolo” incômodo, ele foi se transformando, diminuindo de tamanho e incorporando funções de forma que, a cada momento, quem o tenha decida que não pode viver sem o mais novo modelo que foi lançado. Mesmo que na maioria das vezes não precise, não saiba e não vá utilizar muitas de suas funções.

Na verdade, nós, que somos vizinhos nesse Planeta Terra (apesar de uns morarem melhor que outros) estamos sempre recebendo o lixo “dos outros”, ou aprendendo a criar/fabricar e estimar o nosso próprio resíduo. Pois é, amigos, trago essas reflexões para tentarmos perceber o quanto de lixo chega na nossa casa todos os dias. Não são só aqueles que cheiram mal ou que têm aspecto ruim, mas também os vêm fantasiados de coisas úteis. E me atrevo a dizer que esses são os piores, pois como não os percebemos como tal, nós os absorvemos cada vez em maior quantidade e, com isso, também absorvemos e estimulamos um modelo de desenvolvimento que sobrevive e se alimenta dos resíduos, pois precisa que eles existam para que exista a necessidade de mais produção. É mais fácil resistir se enxergamos as coisas como elas são. Ou seja, se pensarmos bem, o lixo no nosso quintal é muito maior do que conseguimos enxergar!

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