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quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Partilha do pré-sal provoca a ira de Cabral e racha base governista

Por: Raquel Ulhôa - Valor On-line

A pressão do Nordeste por uma maior fatia dos royalties do petróleo da área do pré-sal, que tem como principal articulador o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), rachou a base governista na Câmara, provocou confronto regional só visto na Assembleia Constituinte e pode ameaçar a votação do projeto de lei que define o sistema de partilha de produção como modelo de exploração das novas reservas petrolíferas.

Exaltado, o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), classificou o movimento de "butim" , "roubo" , "oportunismo" e quebra do pacto federativo. Sem citar Campos, atacou o colega de Pernambuco: " Um governador da base do governo está fazendo proselitismo e demagogia com o Estado alheio, querendo se notabilizar nacionalmente com o prejuízo do povo do Rio de Janeiro. Isso não é maneira de ganhar a admiração do povo brasileiro. Não é maneira de se credenciar politicamente para nada."

Cabral pretende cobrar uma solução do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estará hoje no Rio. Ele e o governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), que comandam os dois maiores produtores de petróleo do país (portanto são os principais beneficiados com a distribuição atual dos royalties) passaram o dia em Brasília. Reuniram-se com o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), com líderes partidários e com as bancadas estaduais.

Parlamentares fluminenses e capixabas mostraram unidade e disposição para guerra. Aliaram-se à oposição e obstruíram as votações no plenário. Responsabilizaram Lula, já que ele deu aval para o acordo entre os governadores e o relator do projeto, Henrique Alves (PMDB-RN), em torno das regras de repartição do pré-sal - que o Nordeste agora busca alterar, com a participação, mais silenciosa, de bancadas de outros Estados não produtores.
"A bancada tem que ter posição firme e radical. Declarar obstrução" , afirmou o deputado Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ). "Estamos numa guerrilha" , disse o deputado Deley (PSC-RJ). "Quem bateu o martelo foi o presidente Lula. Quem tem que chamar os deputados e os líderes para resolver é o Lula. Se não fincarmos pé, não tem acordo nenhum" , disse o senador Renato Casagrande (PSB-ES).
Miro Teixeira (PDT-RJ) vê "motivação eleitoral" por trás da articulação do Nordeste. Não citou nomes, mas disse estarem em jogo a vaga de vice-presidente e a sucessão de Temer na presidência da Câmara. Eduardo Campos já teve seu nome lembrado para ser vice da ministra Dilma Rousseff. E um dos líderes de partido aliado, Rodrigo Rollemberg (DF), encampou a causa do Nordeste.

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), não tem participado das articulações, embora o seu Estado seja o terceiro maior produtor. Parlamentares paulistas atribuem ao receio de desagradar interesses de outros Estados. O mesmo argumento é usado por mineiros para explicar as razões pelas quais Aécio Neves (PSDB), governador de Minas Gerais, ainda não se manifestou, em defensa dos não produtores.

O líder do PT, Cândido Vaccarezza (SP), pretende fechar questão na bancada pela aprovação do substitutivo de Henrique Alves como está, mantendo o acordo com o Rio e o Espírito Santo. Mas vai enfrentar muita resistência. São do PT alguns dos principais articuladores do movimento, como o coordenador da bancada do Nordeste, Zezéu Ribeiro (BA), Pedro Eugênio (PE) e José Guimarães (CE) - estes dois últimos, coordenadores das bancadas de seus Estados. Também da parte do Nordeste, a união é suprapartidária.

A reivindicação do Nordeste que causou mais irritação em Cabral e Hartung é para que a nova regra de divisão dos royalties proposta no projeto da partilha - que vai aumentar os recursos dos Estados não produtores - comece a ser aplicada nos campos de pré-sal já licitados, como Tupi (localizado na bacia de Santos, a 250 quilômetros da costa, na projeção cartográfica do Estado do Rio) e Jubarte (no Parque das Baleias, litoral do Espírito Santo).

Esses campos foram licitados pela regra da concessão e sua exploração se dará por esse modelo, pelo qual as empresas arcam com o custo do trabalho e ficam com o óleo retirado e pagam pela produção. Nesse modelo, a arrecadação de royalties corresponde a 10% da produção. Desse volume, 52% ficam com os Estados e os municípios produtores, 7,5% vão para um fundo especial rateado entre todos os Estados e municípios do país (inclusive os produtores, que ganham novamente) e o resto vai para a União.

No modelo de partilha, em que a maior parte do petróleo fica com a União, o relator propõe que o volume de royalties aumente para 15% da produção. Ele definiu uma repartição mais equânime dessa receita: 25% para Estados produtores confrontantes (em cujo litoral fica o campo de pré-sal), 5% para municípios produtores, 44% para o fundo rateado a todo o país segundo as regras dos fundos de participação e o resto para a União. Essas regras passariam a valer apenas para os poços de pré-sal licitados futuramente. Mas os Estados não produtores querem antecipá-las.
"Querem mudar o que já foi licitado. Isso é o fim do mundo", disse Cabral, alertando para a possibilidade de serem rediscutidos benefícios de outras regiões, como a Zona Franca de Manaus e os fundos constitucionais do Nordeste. Estes, criados na constituinte de 88, provocaram o maior confronto entre regiões do qual os parlamentares se recordam. Para Cabral, mexer com os contratos firmados é "inadmissível porque fere princípio federativo e precedente perigosíssimo, porque quebra a regra do jogo." É invasão de respeito federativo. É o fim do mundo. A Câmara não pode se transformar num butim."
O coordenador da bancada do Nordeste, Zezéu Ribeiro (PT-BA), alega que o Rio não vai perder nada: "O que eles têm é uma presunção de arrecadação. Ela não existe" , disse. Parlamentares da região reuniram-se com o relator, Henrique Alves, que busca um acordo. Para Pedro Eugênio (PT-PE), "vale a pena tentar um acordo que evite o confronto no plenário" . Zezéu Ribeiro prevê: "Se votar sem consenso, vira um pandemônio, uma terra de ninguém."

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