Por: Aristides Faria
Hoje (28/05/2019), em meio às minhas leituras matinais, me deparei com uma postagem da Controladoria Geral da União (CGU) chamando a atenção para o prazo de vinte dias (figura), quando entrará em vigor a Lei Federal nº 13.460, de 26 de junho de 2017, conhecida como Código de Defesa do Usuário do Serviço Público.
A Lei dispõe sobre a participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos serviços públicos da Administração Pública e entrará em vigor em municípios com menos de 100 mil habitantes, a partir do dia 17 de junho do presente ano. A lei já está em vigor nos âmbitos federal e estadual e em municípios maiores.
Sou servidor público e minha formação acadêmica e experiência profissional se deram nos campos do turismo e da hospitalidade. Assim, com certa frequência me pego refletindo sobre as relações de hospitalidade e hostilidade no contexto dos serviços públicos, tanto para turistas e quanto para residentes.
Decidi, então, compartilhar algumas reflexões sobre o tema. Primeiro, pela antecedência e ascendência, cito a Constituição Federal (CF) vigente. Em seu artigo 37, consta na CF que a “administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...)”. Temos, então, cinco princípios norteadores dos atos tomados no âmbito do serviço público.
Os princípios são comumente denominados pela sigla “LIMPE”. Dentre estes, eu gostaria de comentar o “I”, ou seja, a Impessoalidade. O entendimento comum entre os estudiosos da hospitalidade é o de que o bem receber é um gesto baseado na pessoalidade, ou seja, eu acolho àqueles a quem eu gostaria de fazê-lo.
A pessoalidade, neste caso, remete à oferta, por exemplo, de abrigo ou de uma gentileza qualquer. Importa notar que há intenção, interesse genuíno em atender a uma demanda de uma pessoa querida.
Ocorre que no serviço público, por outro lado, a hospitalidade reside, justamente, na impessoalidade. Isto é, o prestador de um serviço público deve atender aos usuários – sim, no plural – de modo isonômico.
O Código de Defesa do Usuário do Serviço Público determina “igualdade no tratamento aos usuários, vedado qualquer tipo de discriminação” (Art. 5º, V). Esta prática é, inclusive, uma garantia constitucional (CF, 1988, Art. 5º): “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...)”.
Recentemente, a Lei de Acesso à Informação (LAI) também ajudou a equilibrar a relação entre usuários e prestadores de serviços públicos. Entre outros princípios a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, ajuda a garantir a publicidade dos atos de agentes públicos.
Este dispositivo determina que “são vedadas quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação de informações de interesse público” (Art. 10°, §) e que “o tratamento das informações pessoais deve ser feito de forma transparente e com respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e garantias individuais” (Art. 31).
Retomando o Código de Defesa do Usuário do Serviço Público, gostaria de comentar rapidamente o conceito de serviço público, que é “atividade administrativa ou de prestação direta ou indireta de bens ou serviços à população, exercida por órgão ou entidade da administração pública” (Art. 2°, II); e de agente público, que seria “quem exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza civil ou militar, ainda que transitoriamente ou sem remuneração” (Art. 2°, IV).
Gostaria, deste modo, de registrar aqui estes dois conceitos, que, em minha visão, têm sido postos à prova pelo governo federal vigente. Em diversas situações, noto a tentativa de se criar a narrativa de que o serviço público (ineficiente) e agentes públicos (improdutivos) são a razão de muitos dos problemas históricos e estruturais do país.
Naturalmente, discordo e rechaço essa tentativa de (des)construção da imagem do serviço e dos servidores públicos. Reconheço, entretanto, que a administração pública não é um sistema perfeito e incorruptível. Qual sistema o seria?
Ainda com vistas à impessoalidade, gostaria de sublinhar o Artigo 14, o qual determina as atribuições das Ouvidorias: I - receber, analisar e responder, por meio de mecanismos proativos e reativos, as manifestações encaminhadas por usuários de serviços públicos; e II - elaborar, anualmente, relatório de gestão, que deverá consolidar as informações mencionadas no inciso I, e, com base nelas, apontar falhas e sugerir melhorias na prestação de serviços públicos.
Além destas atribuições, os “órgãos e entidades públicos abrangidos por esta Lei deverão avaliar os serviços prestados, nos seguintes aspectos” (Art. 23): I - satisfação do usuário com o serviço prestado; II - qualidade do atendimento prestado ao usuário; III - cumprimento dos compromissos e prazos definidos para a prestação dos serviços; IV - quantidade de manifestações de usuários; e V - medidas adotadas pela administração pública para melhoria e aperfeiçoamento da prestação do serviço.
Acredito, assim, que o gerenciamento profissional – não necessariamente empresarial! – dos serviços públicos possa contemplar a perspectiva da hospitalidade em seus processos de planejamento, gestão e operação.
Por fim, indico aos colegas servidores os cursos de atualização e aperfeiçoamento profissional ofertados pela Escola Nacional de Administração Pública (Enap), que foi integrada à Escola de Administração Fazendária (Esaf) por meio do Decreto nº 9.680, de 02 de janeiro de 2019. Assim, “com a integração, a Enap assume o desafio de fazer chegar capacitação aos mais de 600 mil servidores públicos federais espalhados pelo país, bem como de contribuir para a capacitação dos quase 10 milhões de servidores públicos estaduais e municipais, mediante ações presenciais e a distância – com a Escola Virtual de Governo (EVG)” (ENAP, 2019).
Um forte abraço!
Sucesso sempre,
Aristides Faria
Referências
BRASIL. Constituição Federal (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 28 de maio de 2019.
BRASIL. Decreto nº 9.680, de 2 de janeiro de 2019. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D9680.htm>. Acesso em: 28 de maio de 2019.
BRASIL. Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm>. Acesso em: 28 de maio de 2019.
BRASIL. Lei nº 13.460, de 26 de junho de 2017. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13460.htm>. Acesso em: 28 de maio de 2019.
CGU. CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO. Código de Defesa do Usuário do Serviço Público entra em vigor em todo território nacional. Disponível em: <http://www.cgu.gov.br/noticias/2019/04/codigo-de-defesa-do-usuario-do-servico-publico-entra-em-vigor-em-todo-territorio-nacional>. Acesso em: 28 de maio de 2019.
ENAP. ESCOLA NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. A Nova Enap. Disponível em: <https://www.enap.gov.br/index.php/pt/noticias/a-nova-enap>. Acesso em: 28 de maio de 2019.
EVG. ESCOLA VIRTUAL DE GOVERNO. Portal institucional. Disponível em: <https://www.escolavirtual.gov.br/>. Acesso em: 28 de maio de 2019.
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